domingo, 30 de janeiro de 2011




Boletim de Ocorrência Dois em Um


Nó Cego, separado duas vezes e morando sozinho num apartamento de bairro de classe média, adora tomar umas por aí, mas sempre mantém vigilância atenta em seu copo com receio de colocarem alguma droga na bebida. Em casa seus passatempos preferidos são brincar na internet e com o “playstation”. O apartamento conta com três quartos, dois dos quais permanecem fechados, pois são para uso de suas filhas, quando elas o visitam.

Pagode, forró, noitada. Nó Cego é doidinho por isso. Num sábado foi a um bar que freqüentava habitualmente. Chegou jogando charme, e logo havia três garotas em sua mesa: uma bonitinha e duas “morromeno”. Passado algum tempo, depois de dançarem um pouco e muito papo furado, nosso amigo deu aquela cantada para seguirem viagem. Elas toparam. Comprou algumas latas de cerveja para beberem no trajeto e foram. Ele, alegre e satisfeito, elas com risinhos contidos.

Com um pretexto bobo, uma delas pediu para parar o carro “ali”, indicando o local com o dedo. Ele convidou a bonitinha a passar ao banco de trás do carro enquanto esperavam. Com isso, a outra “morromeno” foi para o banco da frente.

Aí foi uma conversa daqui, um tal de aperta dali, toma um golinho, vem cá nenezinha, peraí garanhão, vamu começar agora... E ela foi fazendo carinho nele, e ele foi amolecendo, amolecendo, amolecendo até que... Dormiu. E profundamente!

Acordou às sete do domingo, sem o som do carro, sem dinheiro, cartões, cheque. Muito puto da vida foi fazer um boletim de ocorrência, mas apenas uma delegacia distante estava com o sistema no ar. Resolveu deixar para depois.

Passou na casa da ex-mulher para pegar uns cinqüenta contos emprestados, foi para seu apartamento, tomou um banho e foi a ao bar de sempre, pertinho de casa. Lá foi aconselhado por amigos a ir imediatamente à delegacia fazer registrar a ocorrência, e assim fez. Mesmo que longe.

No caminho passou por uma churrascaria. A casa exalava animação. Superlotada, com gente dançando ao som de música popular e em altíssimo volume. Do jeito que ele gosta. Seguiu firme ao seu destino sem se deixar levar, mas, ao chegar, também esta delegacia estava com o sistema fora do ar, sendo impossível fazer o boletim de ocorrência. “PQP”, pensou. “Dar uma viagem dessa perdida!”. Perdida nada, voltou e parou na dita churrascaria para tomar umas.

Incontinente, sentou, pediu uma e olhou ao derredor. Logo identificou uma mesa com uma mulher quarentona, duas novinhas e um rapaz, que acompanhava uma delas. A que estava disponível ostentava um piercing super sensual no nariz. Nó Cego ficou encantado. Em poucos minutos já dividiam a mesma mesa e um papo animado.

Cavalheiro, preveniu aos outros que estava com pouco dinheiro, comentando sobre o roubo. Animado com o andamento dos papos, mas quase sem grana, convidou todos para tomar mais umas no bar de sempre, pois lá podia fazer um vale, e, quem sabe, até arrumar mais algum emprestado caso o pessoal topasse seguir adiante. A de quarenta resolveu ficar, seguindo os quatro para o dito bar.

Chegando, tomaram mais umas tantas, e ele sugeriu que fossem todos a um motel. O rapaz alertou que a garota que o acompanhava era menor de idade, então o programa gorou. Mas Nó Cego não desistiu e: “Então vamu todo mundo lá pra casa!!”. E foram.

Nó Cego organizou o lance. O casal ficou na sala, ele e a de piercing na suíte. Ainda se recuperando do “boa noite Cinderela”, continuou a brincar. Bebida vai, carinho vem. A garota disse que iria à sala falar com a amiga. Ela foi e ele... Relaxou e capotou. E dormiu profundamente.

Acordou no outro dia. Procurou a garota, e não viu. Foi à sala. Ninguém. Logo notou que seu estimado Playstation não estava no local de hábito. Começou a imaginar que algo dera errado. Tentou sair, mas não achou a chave da porta. Com uma cópia conseguiu sair. Embaixo do prédio, nem garotas, nem rapaz, nem piercing, nem carro... Nada!

“Ora de pedir ajuda”, pensou. Foi com um irmão, enfim, fazer o boletim de ocorrência. Enquanto narrava o acontecido desde a noite do sábado, o escrivão começou a rir, e a rir, e a rir. Ria a tal ponto que uma chefe não-sei-de-quê veio lá de dentro saber o que estava se passando, que brincadeira era aquela na delegacia. Mas não era brincadeira, era só o Nó Cego contando ao escrivão esta história que vocês acabaram de ler. E assim foi registrado o boletim de ocorrência “dois em um”.


Altino Farias & Antônio José Felício Pinho
altino.frs@gmail.com

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