terça-feira, 10 de maio de 2011

Academia Cearense de Literatura e Jornalismo




Em setembro de 2010 fui convidado pelo amigo Reginaldo Vasconcelos, jornalista, advogado e cronista por excelência, a integrar um movimento visando a fundação de uma nova academia literária no estado. A idéia dele era formar uma entidade dinâmica, que interagisse com nosso meio sócio-cultural, e não apenas um depositário de nomes ilustres já um tanto inertes.

O corpo da Nova Academia, como a temos chamado, seria formado por nomes ilustres e também por talentos a lapidar, resgatando o princípio da academia antiga, onde mestres conviviam com discípulos e aprendizes, por assim dizer. Outro diferencial idealizado por Reginaldo seria encampar a literatura ligeira, onde figuram a reportagem, crônicas, contos, cordel, como também editores de jornalismo. Todos essencialmente de bom texto.

De início não imaginei porque fora convidado, mas o amigo acabou por me convencer com seus argumentos, sendo a edição do jornal virtual Pelos Bares da Vida uma das mais fortes razões. À época respondi: "Se não bastassem os bêbados e vagabundos, aparecem-me agora esses intelectuais. Sorte minha que eles podem acumular também essas outras duas qualidades. Se me têm com bom texto e letra, que seja".

Seguiram-se vários encontros informais. A maioria teve lugar na residência de Reginaldo, num recanto que ele denomina de Tenda Árabe. Muito uísque, cerveja e papo sobre todos os assuntos rolaram... Até sobre a Academia, pois esses encontros serviam mais para fortalecer os laços de amizade e identidade desse grupo inaugural, que para tratar de formalidades e acertos.

Aos poucos nomes foram sendo propostos, contatos foram feitos, e a coisa foi tomando corpo. A ânsia em ver tudo correndo às mil maravilhas era grande, mas com tantas pessoas envolvidas, tudo tinha que ir acontecendo a tempo certo. Sempre sob o comando do perseverante, paciente, obstinado e malabarista Reginaldo (lidar com egos é uma ciência!).

Consolidado o corpo de imortais, patronos definidos, passou-se à fase de programar a solenidade de instalação da Academia. Trajes formais, hora, local, convites, etc, etc. Depois de muitas delongas a data de 04 de maio de 2011 foi confirmada. A solenidade realizou-se no auditório da Associação Cearense de Imprensa, quando fui empossado, com muita honra e imensa humildade, na cadeira Nº 16, cujo patrono escolhido é o poeta jornalista Syndulpho Câmara.





Para mim esta solenidade não foi um fim, um coroamento, até porque não possuo credenciais para isso. É, pois, um novo começo, e, em companhia de grandes mestres, espero aprender mais e mais sobre a vida.

Agradeço a todos os leitores do Pelos Bares da Vida e do blog Opinião em Perspectiva pelo estímulo e apoio, aos meus parceiros no site Renato, Attila, Robson, Beto Vasconcelos e Luciano Osório pela colaboração, e à minha família pela paciência e cumplicidade.


Altino Farias
Membro da Academia Cearense de Literatura e Jornalismo

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Tradição Quebrada



O espaço é mínimo, o suficiente apenas para duas poltronas antigas, umas quatro cadeiras para espera e um pequeno banheiro. À frente das poltronas, um balcão de fórmica acomoda produtos, brochas, escovas, navalhas, pentes e tesouras utilizadas pelos dois barbeiros, que são parceiros no negócio há anos.

A calçada é o único elemento que separa a movimentada rua asfaltada do primeiro posto. Vez por outra alguém para com seu automóvel e pergunta: “Dá certo às seis?”, ao que o veterano profissional responde: “Tô com três cabelos, passe amanhã que dá.”. Antes de ouvir a resposta, o freguês já entende o “não” e arranca em primeira marcha, aproveitando o sinal verde, calando as impacientes buzinas que soaram à sua parada.

Raramente a sorte baixa e consegue-se cortar o cabelo sem grande espera. Entre um corte e outro o barbeiro pede licença para beber “água”, e vai a um botequim vizinho, voltando rapidinho, pronto para mais um corte, às vezes ainda fazendo careta.


O ambiente é simples. Um grande rádio “portátil” repousa sobre o balcão. Embrulhado num saco plástico, combina com as poltronas antigas e cadeiras capengas. As paredes, sem ver pintura nova há tempos, casam bem com o grande e desengonçado ventilador de teto, que espalha picotes de cabelo pelo ar. A conversa despretensiosa que rola no ambiente, somada ao cenário, remete a barbearias de pequenas cidades do interior.

E foi nessa barbearia que cortei meu cabelo nos últimos vinte anos. Uma tradição! Chegava, cumprimentava a todos e aguardava ser atendido lendo revistas mais que surradas. Para mim do jeito que estiver está bem. Detesto cortar cabelo. Nunca gostei. Na minha vez, sentava na poltrona, e em poucos minutos, bem ou mal, tudo estava resolvido.

Trabalhava lá próximo, o que facilitava o acesso. Depois meu ofício exigia deslocamentos pela cidade, e, sempre que necessário, acomodava a agenda de modo a passar pelo local. Ultimamente, trabalhando longe, havia se tornado um verdadeiro suplício manter esse hábito devido ao trânsito caótico e ao pouco tempo disponível. Insisti mais uma vez, e mais outra. Os engarrafamentos no percurso, cada vez mais insuportáveis, sempre me faziam pensar.

Um dia desses olhei atento para um salão moderno, que fica no meu trajeto trabalho-casa. Anotei o telefone e guardei. O cabelo ansiava por um corte, mas adiei o quanto pude. Enfim, desisti, rendi-me, capitulei, pedi arrego e joguei a toalha. Liguei para o dito salão, avisando que em dez minutos estaria lá. Com cabeleireiro disponível (aqui se suprime a figura do barbeiro), a operação foi rápida, porém não indolor, pois naquele momento mais uma tradição foi por terra, engolida pela selvageria da cidade, e por uma vida sem tempo para perder tempo com o que se preza e gosta.



Pedro Altino Farias, em 09/05/2011