quarta-feira, 8 de maio de 2013

Ser Menos



Talvez seja mal da idade, mas quero ser cada vez menos. O “menos” é saudável quando bem aproveitado. Acredito que pessoas, querendo ser sempre mais, entram numa roda-viva da qual se tornam escravas, e acabam por não saber se devem parar, como ou quando.

O evento Facebook mostra bem esse efeito. Antes de termos essa amplitude virtual à nossa disposição em tempo real, era difícil expor ideias e pensamentos para todos. Hoje, até mesmo coisas de gosto pessoal e atividades íntimas do dia a dia são publicados na net e ganham o mundo em segundos. Muitos querem mais. Aparecer mais, expor-se mais. Parecer mais inteligentes.

Um cara dito intelectual busca razões para embasar seus pensamentos nos filósofos antigos, ou nos iluministas, ou nos revolucionários que fizeram surgir os tempos modernos, ou mesmo numa música ou simples entrevista do Chico Buarque. Complicado, hein?

Por que não ser menos, então? Por que não ter como suficiente seu próprio pensamento e convicções baseadas em experiências e observações vivenciadas? É realmente preciso ter o “aval” de um grande pensador para consolidar sua ideia? Então melhor parar de pensar e ficar somente com que os “grandes” já pensaram e fim.

“Ah, mas o problema é que os outros não aceitam essa simplicidade. Por isso é que se precisa recorrer a alguém ‘maior’, seja lá quem for, para dar legitimidade ao que se diz.”, poderiam me explicar.

O fato é que hoje em dia é difícil alguém falar por si. A recorrência a um pensador anterior famoso faz-se quase que necessário para que alguém exprima o que sente ou pensa com segurança. Então, insisto, que não se pense mais, ora bolas!

Ser menos não é ser menor. Ser menos é uma boa ideia! Meu objetivo atual é esse: ser cada vez menos. Por paradoxal que possa parecer, o “pouco” abre nossa mente para o saber, simplifica a vida e multiplica os prazeres que dela podemos extrair. Simplesmente.

Pedro Altino Farias , em 26/11/2012

quarta-feira, 24 de abril de 2013

Problema



Varou a madrugada pensando naquele problema. Problemão, aliás. Evitou deitar-se na hora habitual. Esticou mais um pouco a leitura, até porque o sono não chegara. Encostou o livro, virou de lado e... Nada! Só aquele problema repercutindo incessantemente em sua cabeça como se levasse seguidas marteladas no crânio.

Dormiu por pura exaustão. Um sono leve e assustado. A cada susto, o coração disparava, parecendo que entraria em colapso a qualquer momento. Minutos intermináveis até dormir novamente. O mesmo sono leve e assustado.

Acordou um trapo. Enfadado, cansado, com olheiras. E com o problema do mesmo tamanho que antes. Não conseguiu tomar café. Não cumprimentou o vizinho no elevador. Não se apressou no trânsito. Afinal, pressa para que? Queria somente que aquele dia passasse logo, os fatos se consumassem e pudesse, enfim, tirar aquele peso dos ombros.

Chegou a hora, o momento da verdade. O problema lhe foi exposto em toda a sua dimensão, com todos os nervos à mostra, todas as suas implicações e consequências. “Solução?”, perguntaram-lhe, dirigindo-lhe um olhar severo.

Avaliações diferentes resultam em conclusões diferentes. Às vezes somente na intensidade, mas diferentes. Soluções diferentes traduzem ângulos diferentes de ver uma situação.

O maior dos problemas é a morte, ou a forma que lidamos com ela. Se o convívio é “bom”, temos a solução de praticamente todos os outros problemas da vida. Todos infinitamente menores (se é que a morte é um problema). Pensando assim, conseguimos nos libertar de muitos males e aflições, mas é difícil, reconheçamos.

Expôs seu ponto de vista sobre a questão e a solução imaginada. Pensavam iguais! Surpresa e alívio! Concordância: sempre desejável, nem sempre possível.

Perdera a noite e, momentaneamente, a paz. Responsabilidade! Chegou até a desejar não estar mais no mundo dos vivos, mas logo em seguida percebeu ser esse um mau negócio, pelo menos por hora. Por fim, triunfou. Mas esse sucesso poderia ter sido menos dolorido. Para tanto, bastava-lhe um “fodam-se” no meio do caminho...

Pedro Altino Farias, em 15/01/2013
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terça-feira, 2 de abril de 2013

A Casa da Praia



Sonhava com um cantinho só nosso e um pedaço de mar a perder de vista. Muitos sonham também. Para isso havia adquirido um terreno na praia há anos, mas as condições financeiras nunca haviam permitido a construção de qualquer benfeitoria que fosse. Mais um ano passado, mais uma vez adiado o sonho. Parecia a linha do horizonte, que se afasta de nós na mesma proporção em que nos aproximamos dela.

Havia dias em que minha mulher me flagrava na prancheta rabiscando o que seria a casa da praia. Um puxão de orelhas me trazia de volta a realidade das posses restritas e sonhos postergados. “Sonhar não custa nada”, argumentava eu. “Quem sabe um dia...”

O ramo da construção civil, no qual eu atuava, é cheio de altos e baixos para pequeno empreendedor, meu caso. Num desses altos, separei modesta quantia, e, num ato de pura irresponsabilidade, resolvi construir uma casinha no local. Tomei a decisão sozinho, pois, submetida ao colegiado doméstico, seria voto vencido ante as demandas prioritárias do cotidiano.

Orçamento e cronograma prontos, escalei pedreiro e servente e mãos à obra. Às terças e sábados corria até a praia, distante setenta quilômetros,  para acompanhar o serviço e suprir necessidades. Bronzeado, minha mulher, intrigada,  perguntava por onde eu andava. “Sou peão de obra e vivo no sol”, respondia desconversando. Mas a pulga continuava atrás de sua orelha.

Ao cabo de quatro semanas um pretexto mal inventado levou a família completa à praia: eu, minha mulher, filha e filho pequenos. Outra desculpa explicava a carrocinha cheia de tranqueiras que o carro rebocava. Ao chegarmos ao terreno, protesto geral: “Construíram um casa em nosso terreno!”; “Como é que ninguém viu isso?”; “E agora?”.

Em meio ao pânico que se estabeleceu, minha mulher viu Max, o pedreiro que trabalhava para mim, sair da casa, e sorriu aliviada, entendendo de imediato o que se passava. Foi assim que aconteceu, e graças a essa “irresponsabilidade” até hoje nos refugiamos no “Solar Além do Horizonte” para curtir o por do sol, bronzear o corpo todo, ouvir o silêncio, ver o amanhecer que é lindo...   


Pedro Altino Farias, em 03/04/2010

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terça-feira, 26 de março de 2013

Entre a Luz e a Espada




Sentia uma pressão aguda na pele à altura do peito. Pendesse mais um pouco à frente, por certo a lâmina fria e afiada daquela espada transpassaria seu coração, fazendo-o sangrar fatalmente. Imóvel, olhos arregalados, o suor escorria pela face, ora parecendo lágrimas, ora parecendo gotas suicidas a precipitarem-se da ponta de seu nariz rumo à morte.

E se retrocedesse? Uma enorme e pesada cruz o aguardava. Um peso de cem toneladas, avaliava, esmagá-lo-ia. Que fazer numa situação dessas, estando entre a cruz e a espada? Embora não houvesse tempo para tal, uma reflexão instantânea se fazia necessária.

Seguir adiante significaria morte certa, com uma lâmina de aço atravessando seu peito. Retroceder trazia a expectativa de ter de suportar um enorme peso, talvez maior que seu corpo aguentasse. “Talvez”, essa foi a chave para sua decisão.

Deu um passo atrás e a cruz, aparentemente impiedosa, pesou-lhe nos ombros. Num primeiro momento suas pernas tremularam, o coração bateu em disparada, o suor encharcou todo o seu copo. Fraquejou. Pensou que não resistiria, mas algum tempo depois...

Mesmo com a cruz ainda lhe pesando horrores, as batidas do coração acalmaram, e ele já podia enxergar adiante. Sabia que desde então sempre teria aquela cruz às suas costas, e entendeu que poderia suportá-la. Mais que isso, começou a compreender como torná-la mais leve e o que a fazia pesar mais.

O tempo foi passando. Somente assim, com a cruz às costas, observou que cada um de nós leva consigo sua própria cruz. Uns a suportam com alegria, disposição e resignação; outros, com pesar, tristeza e inconformismo. Concluiu que a maneira como cada um encara sua cruz é que determina seu peso.

O tempo passou mais um pouco. Lembrou-se daquele dia já distante em que ele olhou para frente e sentiu o frio de uma espada, olhou para trás e viu todo o peso de uma cruz. “Como me enganei!!”, pensou, “Não era uma CRUZ, era LUZ!”.


Pedro Altino Farias, em 25/03/2013

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quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Reflexos



Via-me em ti.
Um dia percebi que havia desaparecido dos teus olhos.
Onde estaria?
Para aonde teria ido?
Voltei, ou nem cheguei a ir?
Não encontrei respostas.

Agora me vejo num espelho.
Diferente de antes, minha imagem repete meus movimentos e gestos.
Olhei mais uma vez e vi tua pessoa em mim, 
Mas... E eu?
Para aonde teria ido? Onde teria ficado?
Novamente não encontrei respostas.

Atordoado, olhei para o passado. Eu ainda estava lá.

 Pedro Altino Farias, em 31/01/2013

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quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Bomba Relógio



Os riscos e irregularidades que podem culminar em tragédias como a de Santa Maria ocorrem todo dia, a todo momento, em todos os lugares. Nós mesmos facilitamos, transgredimos normas, desdenhamos orientações. Depois, "Oh!, que tragédia!!", lamentamos.

Deixando as obrigações não cumpridas do estado de lado (e são muitas), voltemos nossos olhares críticos a nós mesmos. Adoramos comprar um Iphone no preço (contrabandeado) e DVD’s piratas. Contratamos pedreiros para serviços que exigem a expertise de engenheiros. Aconselhamo-nos com balconistas de farmácias ao invés de procurarmos médicos. A lista é imensa...

Como resultado, mantemos ativas quadrilhas de contraventores, edifícios desmoronam, doentes gastam e não resolvem seus problemas... E até pioram, voluntariamente, seu estado de saúde.

Incêndios. A grande maioria ocorre de surpresa, mas não sem aviso prévio. Há várias causas, a maioria  previsível, evitável. Dentre todas, o curto circuito nas instalações elétricas prediais aliado ao contato com materiais inflamáveis, que propaga o fogo rapidamente, é a mais corriqueira. O curto circuito pode ocorrer pela simples fadiga do material, ou por circuitos sobrecarregados e materiais subdimensionados, e pergunto: cadê a figura do engenheiro eletricista?? Ah, não precisou, o “Seu Zé Bundasuja” disse que dava conta. Puxou um fio daqui, emendou noutro acolá e pronto. Foi embora e deixou uma bomba relógio silenciosa pronta para matar a qualquer momento.

Faço esse comentário ignorando a causa da tragédia de Santa Maria, que, parece, ocorreu por uma irresponsabilidade gritante dos integrantes da banda, tendo como co-autores os donos da boate, que receberam um número muito, muito superior de frequentadores ao que a casa comportava.

Faço esse comentário para chamar a atenção para a questão da RESPONSABILIDADE CIVIL de empresas, profissionais e cidadãos em geral, que muitos parecem menosprezar. O certo não é caro, o errado é que é um pouco "mais barato". Então, se vai a algum lugar, se vai contratar alguém, certifique-se ser um lugar seguro, certifique-se que contratará alguém competente, senão... Pode haver muito choro no final da história.


Pedro Altino Farias, em 30/01/2013

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Por Apenas R$ 10,70


Outro dia fui dar entrada num documento no CREA – Conselho Regional de Engenharia e  Agronomia, cuja sede fica no centro de Fortaleza. Parei o carro na Rua Castro e Silva, quase defronte ao prédio. O atendimento não demorou mais que três minutos, o que me deu cerca de uma hora sem nada a fazer. Então... Resolvi perambular, admirando nossa cidade.

ANTIGO SAN PEDRO HOTEL

Era meio dia, e comecei meu trajeto apreciando o próprio edifício do CREA, anterior e originalmente, San Pedro Hotel. Um luxo à época, com apartamentos com vista para nosso verde mar. Depois percorri a Rua Gal. Bezerril. Bucólica, ela conserva paisagens de outros tempos. Bares, lojas de ferragens, de chapéus, redes, artigos de couro e aviamentos se misturam numa miscelânea de cores e formas. 

TRAVESSA CRATO
A travessa Crato é um caso à parte. Ali o tempo parece passar mais lento, as pessoas  sorriam umas para as outras, a correria dá espaço à vida...


PRAÇA DOS LEÕES: TROCA-TROCA DE LIVROS 

Percorrendo a rua no sentido praia-sertão passei ao lado do Edifício General Tibúrcio, projeto de arquitetura de meu saudoso pai, arq. Armando Farias. Logo ali em frente, a Praça dos Leões, na qual estavam montados estandes padronizados para o comércio de livros didáticos usados em bom estado (troca-troca). Um serviço à comunidade.

INTERIOR DA IGREJA DO ROSÁRIO

Continuando no mesmo sentido, desci à esquerda continuando minha caminhada pela Rua do Rosário. Dei uma rápida olhada no interior da igreja do mesmo nome e no Palácio da Luz (Rua Rosário Nº1), onde funciona a Academia Cearense de Letras. Fundada em 1894, nossa academia precedeu à própria Academia Brasileira de Letras - ABL. Quantos sabem disso?

ENTRADA DO PALÁCIO DA LUZ
                                             
Continuando pela Rosário, passei em frente ao prédio do antigo Flórida Bar (Rua do Rosário, 38), onde hoje funciona uma loja de consórcios da Caixa... Saudades!! 


PRÉDIO ONDE FUNCIONOU O FLÓRIDA BAR

Depois me deparei com uma casa de consertos de máquinas de escrever e telex, imaginem. Na mesma rua, uma mercearia, com cereais expostos em surrões à calçada e um mundo de mantimentos lá dentro, entupindo todos os improváveis três metros de largura do comércio. E a casa estava lotada!


MÁQUINA DE ESCREVER, CALCULAR E TELEX: QUEM VAI QUERER?

COM APENAS TRÊS METROS DE FRENTE, MAS MUITO SORTIDA

Mais um pouco à frente, na esquina com a praça dos voluntários, dobrei à esquerda na Perboyre Silva observando suas lojas. Desci até a Sena Madureira, entrei na Melvin Jones (nunca mais havia andado por ali) com suas lojas de rações e equipamentos antigos. Cheguei até o Bar e Restaurante Ipueiras, onde bebi água gelada e bem vinda. 


RUA MELVIN JONES - BAR E RESTAURANTE IPUEIRAS

Olhando para o alto, roupas e toalhas penduradas nas janelas anunciando: “Aqui há vida!”.


AQUI HÁ VIDA!

Fiz o percurso de volta à Praça dos Voluntários, agora a admirando. Surpreendeu-me seu florido jardim, coisa difícil de encontrar em Fortaleza. 


PRAÇA DOS VOLUNTÁRIOS: CANTEIROS FLORIDOS

Continuei pela tortuosa Perboyre Silva, passando pelo edifício sede da gloriosa Associação Cearense de Imprensa - ACI, na esquina com Floriano Peixoto, erguido com muita luta pelo mesmo Perboyre que empresta o nome ao logradouro.


PRÉDIO SEDE DA ACI: LEGADO DE PERBOYRE

Obviamente fui merendar pastel de carne (a azeitona do pastel tem caroço) com caldo de cana na tradicional Leão do sul.



Ao sair da mercearia, a Praça do Ferreira, saudosista e contemporânea ao mesmo tempo, estava aos meus pés com sua coluna da hora e seus jardins. À minha esquerda, a Farmácia Oswaldo Cruz, com sua fachada, mobiliário e muitas lembranças doutros tempos. E pensar que ameaçaram fechá-la  há pouco tempo... Vizinho, a tradicional MILANO, loja de roupas masculinas.




EDIFÍCIOS LOBRÁS E CINE SÃO LUIZ

Ainda à esquerda, o Edifício Lobrás, também projeto de meu pai.  Na sequencia, o Edifício do Cine São Luiz e o do Excelsior Hotel.

EXCELSIOR HOTEL

No fundo, por trás da onipresente Coluna da Hora, avistei o edifício do Hotel Savanah, onde homens de negócios se hospedavam com requinte, e o prédio da Sul América. À direita, a Caixa Econômica.

SAVANAH E SUL AMÉRICA: MAIS DOIS EDIFÍCIOS
REVERENCIAM A PRAÇA DO FERREIRA

A TRADICIONAL CAIXA
                        
Continuando pela Floriano Peixoto, passei pelo Museu do Ceará e o Palácio do Comércio, que passou por recente restauro completo. 



MUSEU DO CEARÁ

Entrei no hall do edifício onde funcionou a Livraria Arlindo, da qual ainda conserva os antigos armários e prateleiras de madeira. A porta de acesso às escadas é do tipo pantográfica, e há um vazio no centro do hall até o último andar, com corredores ao seu redor. Além de tudo isso, um cheiro de nostalgia no ar.

HALL DE ENTRADA ONDE FUNCIONOU A LIVRARIA ARLINDO
FACHADA DO PALÁCIO DO COMÉRCIO 


Saindo, ainda passei pelo prédio dos Correios, já olhando os ponteiros do relógio, que pareciam avançar mais rapidamente que minutos atrás. Fim de percurso, fim de passeio.

PRÉDIO DOS CORREIOS

Depois que apanhei o carro num tenebroso edifício-garagem, passei em frente à Sé, ao Paço do Bispo, à Fortaleza da 10ª Região Militar, ao Passeio Público, Santa Casa, Emcetur e Estação Ferroviária, mas esse vai ser outro passeio...

... E tudo isso por apenas R$ 10,70 e uma hora de meu tempo vadio, com direito a estacionamento, caldo de cana e pastel.


Pedro Altino Farias, em 24/01/2013


ATENÇÃO:
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terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Entre Dois Mundos


Aquele lugar ficava entre dois mundos. Quem chegava não entendia o porquê da irritação e angústia dos “antigos”, mas logo que se tornava um deles, sabia perfeitamente as causas e... Consequências.

Ali não era ruim, nem bom. Tudo era estável e previsível. Até demais. Ocorre que a essência do ser humano é desafiar, questionar, lutar. Apenas sobreviver, como acontecia ali, equivale a uma punição, uma sentença de morte lenta, gradual e impregnada de tédio.

O que deixava todos à beira da loucura era essa previsibilidade, a falta de perspectiva de mudança. Para melhor ou para pior, que fosse, mas que houvesse possibilidades de eventuais mudanças. O novo traz junto com ele o vigor, o brilho no olhar, o pulsar apressado do coração. O “mesmo” nada traz que valha a pena. Ele representa, de forma simultânea, passado, presente e futuro como uma linha reta e gelada no tempo.

Guerras e paixões acontecem por causa dessa inquietude do homem. Ideias brilhantes também, mas como fazer algo de novo naquele lugar? Como ir contra toda aquela grandiosa inércia?

Em determinado momento, ele passou a entender com exatidão toda a irritação interior, angústia e pesar dos “antigos” que habitavam aquele lugar, pois acabara de se tornar um deles. Após muitas reflexões, chegou a uma dramática conclusão: estava onde estava em consequência única e exclusiva de seus próprios atos e pensamentos. E pior, não havia possibilidade de arrependimento ou penitência, já que tudo ali estava definitivamente definido... Pelos menos até enquanto ele assim desejasse.


Pedro Altino Farias, em 20/06/2012


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quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Embriaguez


Ei, rapaz!! Não leva meu copo ainda... 
Tenho mais uma saideira a tomar.
Sei que estou com a roupa amarrotada pelo dia de trabalho; 
e a fisionomia, pela vida...
Mas a saideira tenho que tomar.

Ei, rapaz, não te preocupes, vais receber os teus.
Não sou vagabundo,
Estou  precisando apenas de um pouco da paciência alheia...

Ei, rapaz!! Não conta aos outros da minha embriaguez.
Não me orgulho disso,
Mas se contares, problema teu!!

Pedro Altino Farias, em 01/11/2012


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terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Soltem Seus Balões


Em 2013, soltem seus balões!

Eu... Já estou voando!

Pedro altino Farias, em 25/12/2012


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segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

domingo, 9 de dezembro de 2012

Apocalipse Now



A civilização maia deixou inestimável legado cultural e científico ao mundo. Excelentes astrônomos, possuíam dois calendários: um solar, de 365 dias; e outro para eventos e cerimônias religiosas, de 360 dias. 

Segundo informações colhidas em enciclopédias e livros, eles observavam ciclos, eras, e em 21 de dezembro próximo se encerraria o 13º b'ak'tun, fato interpretado por alguns como sendo o fim do mundo.

Bem, baseado nessa suspeita de fim dos tempos, tenho duas recomendações importantes a fazer:

1ª) Até 21/12/12: Queimem seus estoques.


Coloquem na diária aquele jogo de porcelana que vocês nem sabem ao certo onde está guardado. Se quebrar alguma peça, o que é que tem? 


Vinho. Hum! Tome o vinho que ganhou do amigo vindo da Europa e estava esperando um dia especial. Ele chegou, afinal, o fim da aventura humana na Terra é ou não uma ocasião ímpar?

Contas. Faça novas, não pague as antigas. Repito, queimem seus estoques, inclusive de crédito.

Uísque escocês: beba com os amigos, sempre ávidos por um bom 12 anos na mesa a preço camarada. 

Se tiverem alguma pendência amorosa a hora é essa, lembrem-se, queimem seus estoques e... Navios.

2ª) Depois do dia 21/12/12: Refaçam seus estoques.



Pedro Altino Farias, em 09/12/2012 (quase lá)


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terça-feira, 4 de dezembro de 2012

O Mapa de Suco




Um descuido, copo tombado, suco derramado sobre a toalha da mesa. A mancha que se formou lembrou-lhe o mapa de um lugar qualquer. De imediato veio-lhe à lembrança aulas de geografia do ginásio, quando tinha que decorar informações de países e estados brasileiros: área, população, densidade demográfica, atividade econômica.

O suco, espesso e de um amarelo denso, quase avermelhado, lembrou-lhe também épocas de férias, quando, ainda menino, passava temporada na casa de uma tia. Na hora do almoço, Lúcia, a empregada de anos, trazia uma jarra de suco de manga à mesa. Manga espada, tirada diretamente do pé, que ficava no quintal da grande casa.

Ela fazia o suco cedo e colocava-o numa jarra no congelador da geladeira. Ao servi-lo, pedaços congelados davam-lhe um sabor especial. Coisa de carinho, misturado com natureza e alimentação saudável, tão difíceis nos dias de hoje.

“Corre, corre, pega o pano de prato!”, lembrou-se de tempos atrás, na casa da mesma tia, quando também tombou um copo sem querer. “Desastrado!”, pensou de si mesmo naquele momento, sentindo-se cheio de culpa pelo transtorno causado.

Hoje, em recanto, olhou o suco em forma de mapa se espalhar até ser consumido pela toalha, transformando-se num simples borrão. Depois, calmamente enxugou tudo, sentou novamente e apenas lamentou não haver mais uma gota sequer na jarra. Então, abriu uma cerveja e continuou pensando naquela outra época, na época da inocência, época de mangueiras e quintais. E, qual criança, ficou imaginando como seria bom viver naquele lugar imaginário do mapa de suco.

Pedro Altino Farias, em 03/12/2012

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terça-feira, 13 de novembro de 2012

Desencontros



A música que tocava era das piores, mas como não ouvir?

Meu celular descarregou na hora do “alô”, silenciando minha voz rouca.

A comida chegou antes da fome... E foi embora.

Perdi o que queria encontrar, encontrei o que queria esquecer.

O estômago vazio trai a concentração até que a gente se acostume com ele assim.

Entrei numa contra mão e dei de frente com a Lua. “Agora não”, pensei. “Mais tarde, talvez”.

O estômago vazio parece uma imensa cratera.

Enfim, hora de dormir. Sonhos desconexos completam os desencontros do dia.

Destempero de vida!

Amanheceu. É outro dia. Amém!


Pedro Altino Farias, em 06/11/2012

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terça-feira, 6 de novembro de 2012

A Azeitona do Pastel tem Caroço!



“A azeitona do pastel tem caroço.”, são os dizeres dos cartazes na parede da casa de lanches, um dos poucos comércios tradicionais de Fortaleza, cidade que, ao longo dos anos, vem teimando em apagar sua história.

Quando, garotinho, ia ao Centro com sua mãe. Merendavam nessa casa. Comiam pastel com caldo de cana. A azeitona do pastel já tinha caroço nessa época, mas não havia cartazes. Um dia ele mordeu o caroço de uma azeitona sem querer. Surpresa e dor no pequeno dente de leite.

O tempo passou. A casa manteve suas atividades comerciais. O pastel, considerado dos melhores da cidade, continuou com caroço.

Não se sabe quando, puseram cartazes com o alerta: “A azeitona do pastel tem caroço.”. Alguém deve ter se engasgado ou quebrado um dente. O aviso é pertinente nos dias de hoje, quando se vendem azeitonas descaroçadas; mas soaria surrealista anos atrás, pois à época todas possuíam caroços.

Adulto agora, o garotinho daqueles tempos sempre volta lá para saborear o pastel com caldo de cana. Outro dia olhava um dos cartazes enquanto merendava, e a cada mordida esperava encontrar a azeitona. “A azeitona do pastel tem caroço.”, lembrava a si mesmo. Mais uma dentada e lembrou uma restauração em um dente seu. Custou os olhos da cara e nem ficou tão boa. E se sem querer mastigasse o caroço da azeitona em cima...? Humm!

“A azeitona do pastel tem caroço.”, lembrou mais uma vez, lendo o cartaz que parecia lhe puxar as orelhas o tempo todo. Veio à sua memória o dia em que seu caçula engasgou com uma goma de mascar. Pensou que o pequenino fosse morrer, tão arroxeado ficou.

“A azeitona do pastel tem caroço.”, e mais uma dentada. Agora chegara ao recheio, onde deveria estar a tal azeitona. Mastigou com cuidado. Só carne!

Não contendo a expectativa, lançou um olhar fulminante às entranhas do pastel. Avistou a azeitona, quieta, calada, imóvel, lá no fundo do pastel, pronta para dar um bote!

“Essa aí não me pega!”, pensou, dando uma pequena mordida no pastel de modo a deixá-la descoberta, exposta, vulnerável à próxima investida. Apressou-se no mastigar. Engoliu. Nova dentada. Suave. Azeitona à boca, rompeu sua pele. Sentiu seu suco se derramando na língua. Saboreou-a com cuidado. Depois, esmagou-a, mastigou roendo o caroço. Engoliu a poupa, cuspiu o caroço. Fim!

Limpou a gordura nos lábios com um guardanapo de papel, que jogou no lixo junto com o copo descartável. Ao sair, deparou-se com um último cartaz: “A azeitona do pastel tem caroço.”. “Tinha!”, pensou com um sorriso maroto no canto da boca.


Pedro Altino Farias, em 05/11/2012

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