terça-feira, 15 de março de 2011

Os Mais Rápidos do Mundo

Completei 50 anos dia 12 de março último. Ao chegar em casa no dia anterior, meu filho, Altino José, chamou-me ao seu quarto. Queria dar seu presente. Abriu seu computador, selecionou um arquivo, e eis que surge na minha frente a crônica que vocês poderão ler a seguir.

Para um pai com quase 50 anos (ainda era véspera do aniversário, afinal), amante de carros antigos e de boa escrita, receber do filho um presente que concilia ambas as paixões, e ainda por cima relembra situações passadas... Só poderia mesmo despertar grande emoção. Com vocês...






Os Mais Rápidos do Mundo
Por Altino José de A. Farias





Década de 90.
Essa história começa quando um garoto, com seus 5 ou 6 anos, distraído com a paisagem, vê passar velozmente um carro esportivo. Esse fato chama sua atenção. Afinal, para ele, o carro mais rápido do mundo era o Opala do seu pai, no qual se encontrava no momento. Depois de algum tempo, ele pergunta:

- Pai, que carro é esse?
- É um Mitsubishi, meu filho.
- E ele é mais rápido que o Fusquinha? – (Fusquinha era o outro carro da família).
- É mais rápido sim.
- E é mais rápido que o Opala do senhor?
- É mais rápido que o Opala também.

Essa resposta foi um choque. Para ele, saber que tinha um carro mais rápido que o Opala do pai dele era ter um mundo abalado na sua cabeça. A partir disso, o garoto passou a buscar no trânsito mais respostas.

- Pai, qual é o carro mais rápido que o Mitsubishi?
- Não sei, meu filho.

Outro dia, quando voltava da escola, viu uma moto passar ao lado do Fusquinha. Ela sabia que motos eram bicicletas com motores, apesar de saber só que motores moviam os carros.

- Pai, uma moto é mais rápida que um Mitsubishi?
- Não, não é mais rápido.
- E é mais rápida que um Opala?
- Também não.
- E que um Fusquinha?
- É, acho que é mais rápido que um Fusquinha.

Assim, na lista dos mais rápidos o Mitsubishi liderava, seguido de perto do Opala. Infelizmente, o Fusquinha amargava o último lugar.
Novamente, quando via os carros na rua, avistou um carro de formas quadradas. Logo não tardou a perguntar:

- Pai, esse carro branco, qual o nome dele?
- É o Gol Mil.
O gorato logo pensa. Havia aprendido na escola que havia as unidades, dezenas, centenas e unidades de milhar. E que “Mil” era uma unidade de milhar, maior que todas as centenas. Para esse carro ser Mil, só podia ser bem rápido. Animado, volta a questionar:

- E ele é mais rápido que o Mitsubishi?
- Não é.
- E é mais rápido que o Opala?
- Também não, meu filho.
“Ufa, nem tudo estava perdido”, pensou. “O Gol Mil fica na frente da Moto”.

Assim, cada carro que lhe chamava atenção na rua, ele perguntava se era mais rápido do que cada elemento da sua lista. Quando ele ouvia um sim, acrescentava o veículo na sua lista, reposicionando o ranking. E foi o que aconteceu com o Chevette Hatch da Vovó, com o Gol (imediatamente acima do Gol Mil), Escort, Uno Mille, D20. A lista foi crescendo.

No seu aniversário, ele ganha dois pequenos carrinhos de presente: um vermelho e o outro dourado com o teto branco. Seu pai pega esse último e fala:
“Olha filho, esse carro tem o volante no outro lado. O nome é Mini Austin. Não é legal?”
Ele olha impressionado, abre as portas, dá corda empurrando o brinquedo com as rodas girando para trás, depois solta e vê o carrinho em disparada pela sala. Ele se anima pergunta:

- O Mini Austin, pai, é mais rápido que o Mitsubishi?

Seu pai o olha com carinho e fala mais uma vez pacientemente:

- Não, ele não é mais rápido que o Mitsubishi.

E o garoto repete, para cada carro da sua lista, em ordem decrescente de “velocidade”, até ouvir o sim, e encaixá-lo na lista.
Outra ocasião, ele vê um carro bem diferente na rua, com linhas que lembravam a do Opala do seu pai, mas estranhamente mais esportivas. Ele novamente pergunta:

- Pai, qual o nome desse carro?
- É o Marevick.
- E ele é mais rápido que o Mitsubishi.
- Não.
- E ele é mais rápido que o Opala do senhor?
- É sim, esse é mais rápido que o nosso Opalinha, infelizmente.

Um momento de tristeza bate. O Opala do seu pai já não era o segundo mais rápido. Mas ele rapidamente tem uma idéia e pergunta novamente:

- Pai, tem algum carro mais rápido que o Maverick?
- Tem sim, é o Dodge Charger R/T.
- E ele é mais rápido que o Mitsubishi?
- Não, ele não é.

Melhor não perguntar mais por hoje. O Opala já perdera duas posições. Meses se passam, sua ingênua lista cresce. Mais carros eram acrescidos: Ômega, carro da polícia, Kombi, Belina, enfim, inúmeros outros. Mas o Mitsubishi era invicto, campeão. Um dia, andando no Fusquinha, brincando com seus carrinhos, ele olha para o carrinho de brinquedo vermelho, que levantava os faróis com um botão embaixo do carro, e pergunta:

- Pai, a Ferrari é mais rápida que o Mitsubishi?

O pai olha para o banco traseiro com um sorriso mordaz, e fala calmamente balançando a cabeça:

- É sim. A Ferrari é mais rápida que o Mitsubishi.

O menino vibra. Finalmente sua busca chegara ao fim. Encontrou um carro mais rápido que o Mitsubishi, e conseqüentemente, o carro mais rápido do mundo. De certa forma, o Opala do seu pai finalmente fora vingado.

PS: A valiosa lista, obtida por horas a fio de procura durante meses e a “paciência” do seu pai, foi perdida com o tempo. Porém, sabemos hoje que a Bugatti é mais rápida que a Ferrari.

2 comentários:

  1. Pedro,
    Esse presente realmente é um--"PRESENTE"-- Representa uma relação de respeito, confiança,e, porque não dizer amor entre filho e pai--pai e filho.
    Parabéns aos dois.
    Concita

    ResponderExcluir
  2. Aos meus queridos irmão e sobrinho, ambos Altino,

    Emoção ao ler essa crônica de cumplicidade, de sinceridade, em que um compartilha com o outro o conhecimento, a curiosidade e o amor comum que nutrem em relação aos carros.

    bjs. da irmã e tia.

    ResponderExcluir