“A azeitona do
pastel tem caroço.”, são os dizeres dos cartazes na parede da casa de lanches,
um dos poucos comércios tradicionais de Fortaleza, cidade que, ao longo dos
anos, vem teimando em apagar sua história.
Quando, garotinho, ia ao Centro com sua mãe. Merendavam nessa casa.
Comiam pastel com caldo de cana. A azeitona do pastel já tinha caroço nessa
época, mas não havia cartazes. Um dia ele mordeu o caroço de uma azeitona sem
querer. Surpresa e dor no pequeno dente de leite.
O tempo passou. A casa manteve suas atividades comerciais. O pastel,
considerado dos melhores da cidade, continuou com caroço.
Não se sabe quando, puseram cartazes com o alerta: “A azeitona do pastel
tem caroço.”. Alguém deve ter se engasgado ou quebrado um dente. O aviso é
pertinente nos dias de hoje, quando se vendem azeitonas descaroçadas; mas soaria
surrealista anos atrás, pois à época todas possuíam caroços.
Adulto agora, o garotinho daqueles tempos sempre volta lá para saborear
o pastel com caldo de cana. Outro dia olhava um dos cartazes enquanto merendava,
e a cada mordida esperava encontrar a azeitona. “A azeitona do pastel tem
caroço.”, lembrava a si mesmo. Mais uma dentada e lembrou uma restauração em um
dente seu. Custou os olhos da cara e nem ficou tão boa. E se sem querer mastigasse
o caroço da azeitona em cima...? Humm!
“A azeitona do pastel tem caroço.”, lembrou mais uma vez, lendo o cartaz
que parecia lhe puxar as orelhas o tempo todo. Veio à sua memória o dia em que seu
caçula engasgou com uma goma de mascar. Pensou que o pequenino fosse morrer,
tão arroxeado ficou.
“A azeitona do pastel tem caroço.”, e mais uma dentada. Agora chegara ao
recheio, onde deveria estar a tal azeitona. Mastigou com cuidado. Só carne!
Não contendo a expectativa, lançou um olhar fulminante às entranhas do
pastel. Avistou a azeitona, quieta, calada, imóvel, lá no fundo do pastel,
pronta para dar um bote!
“Essa aí não me pega!”, pensou, dando uma pequena mordida no pastel de
modo a deixá-la descoberta, exposta, vulnerável à próxima investida.
Apressou-se no mastigar. Engoliu. Nova dentada. Suave. Azeitona à boca, rompeu
sua pele. Sentiu seu suco se derramando na língua. Saboreou-a com cuidado.
Depois, esmagou-a, mastigou roendo o caroço. Engoliu a poupa, cuspiu o caroço.
Fim!
Limpou a gordura nos lábios com um guardanapo de papel, que jogou no
lixo junto com o copo descartável. Ao sair, deparou-se com um último cartaz: “A
azeitona do pastel tem caroço.”. “Tinha!”, pensou com um sorriso maroto no canto
da boca.
Pedro Altino Farias, em 05/11/2012
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